segunda-feira, 26 de março de 2012

Praia de domingo


Lá no fundo do mar o sufoco de mim mesmo mergulhado num desejo vindo de sonhos fixos.
O cachorro deitou-se ao nosso lado com o rabo calmo pousado na areia fria.
A areia a roçar nos pés gelados de um caminhar contínuo. Pés duros como pedras.
E tamanhas eram as ondas que mergulhar no meio delas era coisa de menino.
Mergulhar no meio das ondas era quebrar um edifício ao meio.
E na areia, ela sentada fazia cara feia. A cara observadora de chãos.
O cão. O cão dócil a balançar o rabo sem nenhum compromisso, sem obrigações.
E os coqueiros sozinhos viviam concentrados na ventilação mal explicada do mar.
Banho de mangueira pra refrescar. Banho de mangueira. Água quente, terra firme.
Banho de mangueira. Confusão, ciúme, ilusão. Banho de mangueira. Chuveiro desativado.

Pé. Areia. Cara feia. Despeito. Desrespeito. Sol poente. Principio. Mar. Maré. Onda.






terça-feira, 6 de março de 2012

Domingo Liquidificado

O homem escorregou na calçada.
 O relógio esgotou a bateria e a vida parou. 
Sem tempo a vida não fazia mais sentido. 
O queijo foi cortado num impulso assassino. 
O pão.


 As mulheres carregavam as crianças como quem carrega seus embrulhos. 
As crianças eram embrulhos num domingo afogadas nos lençóis amarelecidos.
 Os fios de alta tensão desprezavam o medo de choque e os dedos esbarravam nos fios mortais.
 A morte estava longe e dormia. 
Pombo ferido de bico partido na calçada.
 Sol nu.


 O sol não se envergonhava de sua clareza.


Quase Cinco da Manhã

      De noite eles saíram. A noite era cortada por gritos eufóricos da embriaguez. O céu começava a destilar um clarão comum do dia. Eram quase cinco da manhã e os postes já não reluziam mais. Ela ia trôpega nos próprios paços levitados, carregava um semblante brando num misto de embriaguez, sono, medo, raiva e luxuria. Ele ia sendo levado por um impulso só ele estava mesmo ébrio, mas o cansaço lhe era apenas a manhã desabrochando flor de corola amarela. 

Papo Diferente

   Foi ao chegar no barzinho que me acalmei. Esperando já a mais de uma hora eu já me sentia completamente aborrecido. Meus amigos me asseguravam que estavam por chegar, com menos de dez minutos estariam na praça. Mas estando eu ansioso e nervoso resolvi tomar uma cerveja. Quando entrei no bar veio uma criança me seguindo decidida. Tratava-se de um menino de cabelos castanhos claros e que cobria suas orelhas. Pedi uma cerveja ao dono do bar e sentei na mesinha de frente pra rua. O garoto veio até mim e me perguntou: Ele é seu amigo? Apontando para o dono do bar. Eu respondi que sim por pura educação, pois o dono do bar, que por sinal nãos conheço nem o nome, não é meu amigo, apenas me serve e eu lhe pago. O dono do bar é senhor já de cinqüenta anos, que carrega uma careta mal encarada e não nos ouve geralmente quando a cerveja seca ou quando precisamos de um novo copo. O dono do bar parece não gostar do trabalho que faz. O garoto moreno claro puxou a cadeira sem que eu o convidasse me demonstrando uma atitude muito ousada. O garoto me pareceu ser parente do dono do bar, mas ao sentar fiquei na dúvida. O garoto perguntou meu nome e lhe respondi simpático, paciente. Foi então que começou a me perguntar coisas vindas de uma mente curiosa infantil e doce.
      - Como è uma cama de solteiro? Fiquei espantado com a pergunta desconexa e lhe respondi que se tratava de uma cama pequena onde só dorme uma pessoa, onde repousa uma pessoa que geralmente vive sozinha no seu quarto ou casa.
      O garoto ficou sentado e se mostrava comportado. Então uma cama grande é para pessoas casadas, concluiu o menino. Perguntei-lhe com quem ele estava, fiquei até cabreiro pelo fato de seu responsável não ter ido até a mesa buscá-lo. Ele apontou para umas pessoa que bebiam e conversavam no balcão lá na frente do barzinho, estou com minha mãe, me disse.
      - Você tem namorada? Novamente o interrogatório.
      - Não. Sou solteiro. E aquelas perguntas vindo de uma criança me deixava um pouco sem graça. A Treze de Maio estava movimentada e as pessoas passavam olhando, apressadas.
      - As crianças podem ficar aqui? Eu acho que não, pois só tem eu de criança aqui, e só vejo gente adulta.
      - Bem, acho que as crianças só não podem beber aqui. Ele me olhava com atenção, escutando minhas respostas. Fui lhe fazendo algumas perguntas, mas logo percebi que se tratava de uma pessoa que não era muito de responder, e sim de perguntar. Aceitei.
      - Meu nome é Natham. Eu moro com minha mãe. Você já é adulto? Quantos anos você tem?
      - É eu já sou adulto, tenho vinte anos. E você quantos anos tem? Hum... oito anos é uma boa idade. Chegou um momento em que as perguntas cessaram e o menino desviou o olhar para a rua como se perdesse num pensamento triste. Fiquei impaciente, mas não deixava isso transparecer. Enquanto isso, as pessoas que deveriam estar cuidando do garoto não manifestavam nenhum tipo de preocupação. Ele permanecia na minha companhia.
      - você é veado? Ele me perguntou. Fiquei encabulado com a pergunta e lhe respondi que não. A minha intimidade não importava àquela ousada criança.
      - Você conhece alguém assim? Perguntei e ele apontou para os rapazes que faziam companhia a sua suposta mãe.
      E quando eu não esperava já envolvido por uma leve embriaguez diante dos copos absorvidos de cerveja, meu amigo aparece alto e de repente diante do meu mais novo amigo Natham. Eu lhe forneço um sorriso e lhe apresento para o garoto que logo demonstra desaprovação para com meu amigo que eu esperava. Fábio este é meu novo amigo Natham, e ele indignado com algo que eu desconhecia respondeu aborrecido que seu nome não era Natham. As pessoas que deveriam estar cuidando do garoto saíram do bar e ficaram atrás da parede do barzinho de forma que eu não podia vê-los, e o garoto permaneceu na mesa conosco. Estranhei, achei que ele teria me enganado sobre sua mãe, e seu rosto agora expressava um princípio de choro. Por um instante achei que o garoto estava perdido, e que inventara que sua mãe estava por perto, mas uma voz feminina gritou seu nome ordenando que a seguisse. O garoto se foi com raiva de mim, e não me disse tchau.